quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

EDUCAÇÃO SOMÁTICA: o agora-simultaneamente-imediato-presente-interligado.

Hellen Katiuscia de Sá




“Para ser grande, sê inteiro: nada teu exagera ou exclui. Sê todo em cada coisa. Pões quanto és no mínimo que fazes. Assim em cada lago a lua toda brilha, porque alta vive...” (Ricardo Reis – heterônimo de Fernando Pessoa).





Resumo:
Este trabalho discorre sobre a Educação Somática e sua aplicação como atividade pré-expressiva no campo de estudos e pesquisas que envolvem Teatro e Dança. O artigo enfoca e apresenta o surgimento do termo ‘Pensamento Somático’ como uma consequência motivada (e que extrapola) os estímulos da consciência do movimento no ator-bailarino, ajudando o indivíduo a fazer conexões de ideias que o auxiliam na compreensão de qualquer acontecimento histórico-social relacionado à manifestação artística enquanto linguagem cultural envolvendo outros fatores que dialoguem para sua ocorrência, tais como: aspectos políticos, econômicos, educacional, etc.



Palavras-Chave: Educação Somática; Subjetividade; Pensamento Somático.



Imagine que existam técnicas corporais para que alunos de dança e/ou teatro possam ao mesmo tempo condicionar o corpo, aprimorar seu estado de presença cênica e também aprender a movimentar conscientemente sua musculatura em prol de algo além do movimento coreografado, ajudando o artista a conectar-se com seu estado de plena ‘expressividade’ interior através da CONSCIÊNCIA CORPORAL. Essa é a proposta da Educação Somática aplicada à Dança.
O termo veio à tona em 1983 num artigo escrito por Thomas Hanna, publicado na revista cientifica Somatics. Neste artigo seu autor afirmava que Educação Somática é “a arte e a ciência de um processo relacional interno entre a consciência, o biológico e o meio-ambiente. Estes fatores vistos como um todo agindo em sinergia.” (HANNA, 1983, p.7).
Entretanto:
[...] historicamente, os métodos de Educação Somática começam a ser estruturados na Europa e em seguida na América do Norte, um pouco antes da Primeira Guerra Mundial. Seus criadores são, em sua maior parte, cientistas e artistas. Os métodos são criados por ocidentais para ocidentais. Uma primeira diferença: embora o campo da Educação Somática postule que o homem é um ser total – corpo, mente e espírito – e que o corpo é indissociável da consciência, nenhum dos métodos é ligado a um sistema religioso em particular como o hinduismo, a vedanta ou o taoismo. Uma das especificidades da Educação Somática é que nenhum de seus métodos pede do aluno a maestria da forma. A tônica das aulas de Educação Somática é uma exploração dos movimentos propostos e não o aperfeiçoamento de posturas ou coreografias fixas. (BOLSANELLO1, 2008, pp. 2-3)

Como um campo de estudos teórico-prático que se interessa pela consciência do corpo através da reeducação do individuo enquanto observador de si mesmo, a Educação Somática vale-se de diferentes técnicas tais como: Pilates, técnica de Alexander, Feldenkrais, Ginástica Holistica, Antiginástica, Yoga, etc, sendo que cada uma possui seus próprios princípios e estratégias pedagógicas objetivando a reeducação do movimento, promovendo a subjetividade, a inteligência do gesto e a singularidade do corpo em sua individualidade.
Em outras palavras: a Educação Somática abre caminho para que o artista da cena consiga desconstruir um corpo antes adestrado, preso e moldado por formas de danças coreografadas e/ou formas condicionadas exteriores à sua real expressividade enquanto individuo, para que ele – explorando sua potencialidade interior através do movimento corpóreo –  possa delinear sua própria escrita cênica através do gesto livre, fluente através da respiração orientada pela consciência plena de seu corpo, gerando uma subjetividade escrita para a cena. Pode parecer meio confuso para quem não faz dança ou não vai ao palco como ator.
Entretanto, por muitos séculos a arte dramática e a dança, principalmente, foram engessadas  por movimentos, truques e posturas antinaturais e rígidas, tornando-os artificiais ou sem verdade cênica. Algo bonito, porém sem alma; isto porque seus interpretes executavam com virtuosismo, com maestria e exatidão o movimento apenas de fora para dentro, desligados do que o gesto executado significava para eles fora do contexto da peça ou coreografia; e por isso mesmo um movimento desconectado da subjetividade de seu interprete.
Essa subjetividade é solicitada quando o professor de Educação Somática pede aos alunos para executarem exercícios que demandam além do esforço físico e da consciência do movimento, a imaginação do individuo para poder executá-los, e com isso a tecnologia interna (conexões neurais e musculatura parassimpática) é acionada abrindo espaço para que novas formas de conhecimentos cognitivos venham à tona possibilitando a desconstrução da ‘couraça’ que nos impede de usar novas percepções de nós mesmos e de mundo. Sim! Porque a Educação Somática não se restringe apenas ao corpo físico, ela abraça tudo que está no individuo desde o conhecimento cognitivo, motor, sensorial, afetivo e espiritual e com isso dilata a compreensão do que está fora do individuo aparentemente, pois tudo está conectado: o meio interno e externo.

Ampliar a noção de corpo. Descobrir que é possível se resgatar a autenticidade somática, tantas vezes deformada por valores socioculturais. O professor de Educação Somática propõe ao aluno movimentos estruturantes visando direção e alinhamento da estrutura óssea; posturas visando um alongamento fino, solicitando os músculos “internos”, tendões e fáscias; movimentos que utilizam a imaginação e transformam a imagem corporal; exercícios lúdicos com a função de regular o sistema nervoso; sequências de movimentos inusitados visando a desconstrução de padrões motores fixos. Reaprender significa desafiar velhos padrões cognitivos para que o cérebro faça novas conexões neurônicas. Mas, como é possível abandonar nossas couraças de defesa se vivemos em um contexto de violência, pressionados pela competição profissional, duros de medo, impotentes diante da injustiça social e violados pela poluição? O que fazer quando as mudanças que vivemos nas aulas de Educação Somática entram em conflito com o estilo de vida que temos? Feldenkrais costumava dizer que quando só conhecemos uma maneira de fazer algo, estamos presos a um padrão. Mas, se conhecemos duas maneiras de fazer algo, temos escolha. E se conhecemos três maneiras de fazer algo? Temos liberdade. (BOLSANELLO, 2008, p. 2).

Na historia do desenvolvimento das técnicas utilizadas na Educação Somática, o caráter desafiador da medicina tradicional foi o carro-chefe dos ditos ‘reformadores do movimento’, como endossa Márcia Strazzacappa2; como no caso das técnicas desenvolvidas pelo alemão Joseph Pilates (1880 – 1967); um homem que tinha a saúde fraca, com problemas ósseos seríssimos, fator que o forçava permanecer numa cama maior parte do dia. Em sua infância ele foi assolado pela asma, raquitismo e febre reumática. Durante a I Guerra Mundial, Pilates foi preso na Inglaterra, como cidadão alemão foi considerado inimigo daquela Nação. E na sua cela, ele começou a explorar e criar movimentos adaptados para não sucumbir às suas enfermidades.
Pilates inicia sua trajetória de autoconhecimento através de seus movimentos corpóreos: descobriu novas formas de se exercitar e também estimular e recuperar músculos atrofiados promovendo uma reabilitação e reequilíbrio a ponto de levantar-se da cama e resgatar plenamente sua saúde. E atualmente o mundo conhece as técnicas de Pilates, cuja finalidade não é exatamente para fins estéticos, e sim para reabilitação e correção postural do individuo.

Os reformadores do movimento não tinham como objetivo o desenvolvimento de técnicas terapêuticas, nem queriam questionar as práticas médicas de sua época. O objetivo deles era encontrar soluções para seus respectivos problemas. No entanto, ao iniciarem suas pesquisas e definirem seus métodos, as aplicações terapêuticas e as críticas às práticas já existentes acabaram sendo uma consequência quase inevitável. (STRAZZACAPPA, 1998, p. 50).

Outro exemplo de técnicas terapêuticas utilizadas em Educação Somática que emergiram por motivos pessoais de superação de problemas de saúde não contemplados pela medicina tradicional, são as técnicas desenvolvidas por Moshe Feldenkrais (este teve um problema grave no joelho), por Mathias Alexander (um ator que perdeu a voz), dentre outros exemplos de indivíduos insatisfeitos com o diagnóstico fatalista da medicina corrente de sua época.
Além da questão da saúde (esta porém, não necessariamente regra), outro fator observado no desenvolvimento das técnicas hoje utilizadas em Educação Somática, é a questão de o conhecimento partir empiricamente após experiências concretas e corporais dos reformadores do movimento, onde o  fator sensorial é amplamente levado em consideração para a formulação do conhecimento; esta consequência soma-se à tríade que corresponde os pontos em comum para o surgimento das técnicas: o pensamento fundador da unificação corpo/espírito na soma das partes componentes do ser humano.
Desse modo observam-se os pontos em comum, que naturalmente concorreram para o surgimento das abordagens  em Educação Somática:
a) a maioria das técnicas em Educação Somática surgiu da vontade de solucionar um problema de saúde não contemplado pela medicina tradicional;
b) a pesquisa empírica,  que tomou a concepção do ‘corpo enquanto experiência’, (conceito central da pedagogia aplicada em Educação Somática, termo proposto pela Fenomenologia –  corrente filosófica desenvolvida por Merleau-Ponty, cuja compreensão do conhecimento também é apoiada sobre a referência epistemológica do construtivismo da educação), onde através da prática e/ou do experimento segue-se a teorização do que foi visto;
c) o pensamento holístico de que a unidade corpo/espírito deve igualmente ser tratada conjuntamente e não um apartado do outro. ‘Corpo’ e ‘Espirito’ compõem o ser humano, estão juntos neste grande veículo de estímulos, porém, devem ser abordados de forma diferenciadas, posto que têm particularidades distintas.

Posso dizer que as consequências de minhas aulas de Educação Somática na Dança ramificaram-se para outros pontos de percepção, além da consciência do movimento. Isso se deve ao caráter holístico das atividades teórico-práticas. Em sala, após lermos e discutirmos alguns textos de Débora Bolsanello, ficou evidente esse olhar dilatado para dentro e fora de mim, coisa que eu chamo de pensamento somático. E por tratar-se dessa compreensão interligada onde as partes e o todo são igualmente apreendidos, já percebo com outra compreensão coisas fora do campo da dança ou restrito à consciência do movimento, que a priori, estariam relacionados à finalidade dos exercícios em Educação Somática na Dança.
Por exemplo, consigo analisar situações cotidianas, ou fazer conexões mentais de outras manifestações artísticas (que não a dança ou algo relacionado à prática física do corpo) mediante um pensamento somático, porque através da consciência dos movimentos de meu corpo físico foi acionado outras formas cognitivas de percepção. O que gera algum sentimento ou inquietação mais sutis, é percebido por outras vias. Essa sensibilização para absorver esse ‘algo inteligível’ do cotidiano e leituras de outras manifestações artísticas, dialoga com os objetivos holísticos que se destinam a Educação Somática.

A particularidade da Educação Somática é a transmissão de instrumentos que despertam no aluno o gosto pela auto-investigação através do movimento de seu corpo. Na medida em que a consciência de uma pessoa se expande – usando o corpo como veículo dessa expansão – mais ela estará apta a fazer sentido de suas próprias emoções. Uma pessoa desenvolve sua capacidade de sentir estará mais apta a fazer escolhas que contribuam à realização de suas potencialidades. (BOLSANELLO, 2008, p.3).

Recordemos o conceito de Holismo. O termo tem origem na palavra grega ‘Holos’, que significa ‘todo, inteiro’, para a expressão de corpo enquanto experiência abarca uma visão não-fragmentada do real experimentado pelos canais perceptivos humanos. Desse modo as sensações, sentimentos, intuições, criatividade e razão são manifestadas, recebidas e consideradas em conjunto, onde cada fator age no outro interagindo reciprocamente, permitindo ao ser humano plena harmonia das informações absorvidas do meio em que vive, acarretando mais consciência no ato de tomar decisões mais plenas, mais amorosas e mais sábias acerca  de soluções adotadas para cada tipo de situação. É uma visão de ‘corpo’ onde as partes de um sistema de ideias encontram-se no todo, cujos princípios e leis que regem esse todo encontram-se nas partes, ou seja, tudo está conectado.

O termo corpo redefine-se no momento em que a experiência humana e a subjetividade são validadas como fonte do conhecimento, bem como a revisão da separação, atribuída por Descartes (1596-1650), entre corpo e espírito. A relação que compreende as questões comunicativas internas do homem com as questões externas do mundo, do mundo com o homem e do homem com ele mesmo vem provocando, até então, impactos sobre a constituição do ser humano como sujeito de si próprio e na produção de subjetividade como processo cultural, social, político e também estético. Paralela às concepções mecânica e dualista do corpo, uma outra maneira de concebê-lo começa a emergir gradualmente desde o Pós-Revolução Industrial. Filósofos como Merleau-Ponty colocaram em evidência a subjetividade do ser humano em sua experiência corpórea. (SILVEIRA3. 2009, p. 2).

Em Educação Somática,
 [...]essas abordagens ditas ‘holísticas’ ou ‘alternativas’ podem ser consideradas uma tecnologia interna porque são compostos de técnicas que usam recursos inerentes ao organismo humano: a respiração, o movimento, o ritmo das funções vitais, os meridianos, etc. Elas investem na capacidade de autoregulação, sistema que garante o equilíbrio global da pessoa, primando pela prevenção da doença ou pela recuperação. A intervenção medicamentosa ou cirúrgica só é necessária caso o sistema de autoregulação não cumpra bem seu papel. Desenvolver sua tecnologia interna equivale a dar suporte ao poder de auto-cura do organismo. (BOLSANELLO, 2008, p. 2).

Ressalto que através de estímulos corporais onde o aprendizado pela vivencia acontece através do corpo enquanto experiência, despertou em mim o pensamento somático que  rege essa compreensão exterior das coisas, da qual me refiro. Chequemos novamente os pontos principais de convergência para o surgimento de novas técnicas corporais que hoje povoam a Educação Somática, enfatizando somente a AÇÃO impulsionadora para o surgimento das técnicas hoje empregadas: VONTADE; EXPERIMENTO/EMPIRISMO; e sua consequência direta: CONSCIÊNCIA DO TODO INTERLIGADO NA SOMA DAS PARTES.
Agora tomemos como exemplo a Semana de Arte Moderna de 1922, no Brasil. A vontade dos jovens artistas idealizadores daquele período, era manifestar sua insatisfação com os rumos do aspecto cultural do País. As obras apresentadas durante esta semana englobavam Poesia, Pintura, Música, Escultura e Literatura. Estes jovens artistas concorriam para uma renovação das linguagens, ousavam a experimentação das formas, exprimiam a liberdade criadora em suas obras. Promoveram uma ruptura violenta com o passado empoeirado e desbotado das velhas formas artísticas que já não faziam conexões com o presente momento político e sociocultural no Brasil (e no mundo) de 1922, as obras dessa Semana Moderna além de inteligentes, instigantes e detentoras de uma beleza exótica, denotavam fortes criticas sociais.
Outro exemplo: no período histórico da Ditadura Militar no Brasil, em meados de 1967, outra reviravolta nos rumos culturais do País: uma clareira surge! O movimento Tropicália explode – tipo um coletivão de cantores, músicos, artistas, poetas e compositores solo emergindo os grupos musicais experimentais como os ‘Novos Baianos’ e ‘Os Mutantes’; um saladaço musical de ideias efervescendo; o Tropicalismo influenciado e influenciando também a linguagem cinematográfica (Cinema Novo), a linguagem teatral (exemplo das peças anárquicas e ousadas de José Celso Martinez), dentre demais manifestações artísticas de vanguarda que captaram essa reverberação. O Tropicalismo também teve sua raiz irmanada na Semana da Arte Moderna de 22, com a releitura do sentido de antropofagia cultural, Concretismo e da Pop Art.
Além desses exemplos nas Artes, há inúmeros outros em todas as áreas do conhecimento (Filosofia, Antropologia, Sociologia, etc), onde alguém ou um grupo de estudiosos ou apenas pessoas insatisfeitas, contestaram o comportamento vigente de sua época acerca de determinado assunto; partiram para a experimentação, para a teorização à posteriori em alguns casos, e dessas ações surgem outras concepções de realidades – que a principio estavam segregadas apenas a uns poucos que tinham essa visão emancipada e ao mesmo tempo, conjunta das coisas; alguns os chamam de visionários.
Percebe-se que nesse movimentar de ações e ideias há interferências externas que motivam uma inquietação interna no individuo (soma das partes no todo), partindo do pressuposto de que essa inquietação gera uma ação experimental a ponto de se criar outro algo-fora motivado por um algo-dentro através da curiosidade/busca/vontade desse individuo transformador e em transformação. A insatisfação com o ‘ordinário’ impulsionou esses sujeitos abrirem novas janelas e portas ao ‘extraordinário’ para que mais pessoas pudessem também VER e SENTIR e EXPERIMENTAR outras realidades possíveis... eu considero esse raciocínio e leitura de fatos históricos, comportamentais e/ou artísticos aparentemente ‘disfuncionais’, um raciocínio analítico proveniente de um ‘pensamento somático’ e Holístico.
Arrisco dizer que desse raciocínio analítico, proveniente de um pensamento somático e Holístico, há medida que mais e mais pessoas iniciarem sua jornada de autoconhecimento conforme o conceito de corpo enquanto experiência – usufruindo dos exercícios de Educação Somática, abrir-se-á espaço para o aparecimento de uma CULTURA SOMÁTICA, onde todos se reconhecerão partes plenas constituintes de um Todo: seres mais conscientes, mais equilibrados e sadios, pois a cura verdadeira sempre parte de dentro para fora.
a conclusão para o fechamento de meu raciocínio acerca do pensamento somático veio enquanto eu aprontava meu jantar de hoje. Ao cortar cebola e alho para refogar, as frases abriam-se na minha mente feito raios solares sorrindo por detrás das nuvens. Corri para o computador para não deixar escapar. Daí, concluo que a partir do momento que eu entendo que meu corpo (físico + espírito + sensações + sentimentos + intuições + criatividade + razão) funciona interligado a esses fragmentos de mim, compreendo que o fora de mim também é fragmento desse todo de mim. Daí, minha conscientização de que minhas ações aparentemente isoladas, reverberam no meio exterior de mim. Eu sou o meio ambiente onde vivo. Minhas ações e/ou omissões constituem minha realidade fora de mim, isto é consequência de um ‘pensamento somático’.
Entretanto, esse artigo ainda é a pontinha do iceberg acerca de minha ideia desse assunto, pois “o conhecimento é construído a partir da experiência pessoal, e que estilos e padrões precisos de ações individuais são desenvolvidos em um contexto social compartilhado que envolve o discurso, a linguagem e a ação corporal”. (FORTIN, 2005, p. 11).


Hellen Katiuscia de Sá
Escrito em: 24, 25, 26 e 27 de dezembro de 2012.





REFERÊNCIAS:

BOLSANELLO, Débora, “Educação Somática: investindo na tecnologia interna”. 2008. Disponível em: <www.movimentoes.com>. Acessado em: 24 dez. 2012.

BOLSANELLO, Débora. “Educação Somática: o corpo enquanto experiência”. Motriz, Rio Claro, v.11 n.2 p.99-106, mai./ago. 2005.

BOLSANELLO, Débora. “Corpo Livre e Corpo Possuído”. 2008. Disponível em: <www.movimentoes.com>. Acessado em: 23 dez. 2012.

Conceito de Fenomenologia, disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Fenomenologia>. Acessado em: 26 dez. 2012.

FORTIN, Sylvie e LONG,  Warwick. ”Percebendo diferenças no ensino e na aprendizagem de Técnicas de dança contemporânea”. In Movimento. V.11, n.2, p. 9-29. Porto Alegre, 2005.

SILVEIRA, Saulo. Dança-Teatro e Pesquisa-ação Somática: os Bartenieff Fundamentals como fonte de experimentação para o preparo corporal de artistas cênicos com deficiência física”, PPGAC-UFBA. Disponível em:

STRAZZACAPPA, Márcia. Resumo do último capítulo da tese de Doutorado: “Fondements et enseignements des techniques corporelles des artistes de la scène dans l’état de São Paulo, au XXème siècle”, Universidade de Paris, França, 2000.


_____________________
1Débora Bolsanello nasceu no Brasil e é cidadã canadense. Bacharel em antropologia pela Université de Montréal, Mestre em dança pela Université du Québec à Montréal. Sua dissertação aborda a aplicação de técnicas de educação somática dentro do tratamento de dependentes químicos. É assistente de pesquisa do CERAP - Centro de Estudos e Investigação Aplicada em Psicopedagogia Perceptiva, Universidade Fernando Pessoa do Porto, Portugal.  Hoje, Débora Bolsanello é a diretora pedagógica da Formação em Técnicas de Educação Somática no Brasil. Diplomou-se massoterapeuta pelo Institut Kinéconcept em Montréal. Formou-se no Centre Pilates de Montréal; atuou como docente no programa "Abordagens Terapêuticas Corporais" da Universidade Pestalozzi, Rio de Janeiro, Brasil.  Pós-graduou-se em educação somática pela Université du Québec à Montréal. É certificada como professora de autoreeducação corporal pelo Centre d`Étude et Recherche en Autorééducation Neuromusculaire, Montréal.

2Márcia Strazzacappa é Doutora em ARTES: Estudos Teatrais e Coreográficos (Université Paris VIII, França, 2000); Mestre em Educação (UNICAMP,1994); Pedagoga (UNICAMP,1986) e Bacharel em Dança (UNICAMP, 1990). Foi pesquisadora do LUME/UNICAMP (1986/1995) É professora da Faculdade de Educação da UNICAMP da qual foi diretora associada (2008/2012) e coordenadora de graduação (2001/2004). É coordenadora adjunta da Comissão Permanente para os Vestibulares da Unicamp (COMVEST). Atua nas graduações de Pedagogia, de Dança e de Teatro. Sua pesquisa enfoca os campos da Arte e da Educação, principalmente nos temas: Dança, Teatro, Formação Professor, Educação Estética e Educação Somática. Professora da Pós-Graduação em Educação, é membro do Laborarte - Laboratório de Estudos sobre Arte, Corpo e Educação, do qual foi coordenadora até 2008. É membro e foi vice-coordenadora (2008/2010) do GT Educação e Arte da ANPEd (Associação Nacional de Pesquisa e Pos-graduação em Educação). É membro da ABRACE (Associação Brasileira de Pesquisa em Artes Cênicas). Dentre suas publicações, destaca o livro intitulado "Educação Somática e Artes Cênicas" (Papirus, 2012). Artista da dança atuante, seu último trabalho coreográfico intitula-se "Sobre mulheres e lobos" (2010). Tem se apresentado com sua personagem clownesca, Dona Clotilde, em diversos eventos nas áreas de Educação, de Arte e de Saúde, nacionais e internacionais. 

3Saulo Silveira é professor/pesquisador da Escola de Teatro e Dança da Universidade Federal do Pará (ETDUFPA), recentemente atuou nas funções de coordenação do Curso Técnico em Dança (habilitação em Intérprete/Criador em Dança) e do Núcleo de Apoio às Pessoas com Necessidades Específicas (NAPNE) da ETDUFPA. Dirigiu o projeto de pesquisa Diversidade Corporal e Educação Somática na Prática da Dança e o projeto de extensão Cena em 5: espaço de produção cênica acadêmica. Atualmente doutorando em Artes Cênicas pela UNIRIO (2014); Mestre em Artes Cênicas pelo Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas da Universidade Federal da Bahia (2009) e graduado (Licenciatura Plena) em Educação Física pela Universidade Federal de Juiz de Fora (2006). Tem experiência na área das Artes com ênfase em Educação Somática, atuando principalmente nos seguintes temas: Diversidade Corporal, Educação, Dança e Técnicas Corporais.

terça-feira, 4 de dezembro de 2012

TEXTO Nº11 - Katiuscia


ESCOLA DE TEATRO E DANÇA DA UFPA
GRUPO DE PESQUISA E EXTENSÃO EM EDUCAÇÃO SOMÁTICA NA DANÇA
Coordenação: Profº Mestre Saulo Silveira


Gostaria de poder descrever melhor minhas sensações a respeito da aula do encontro do dia 03/12, porém, é algo que não existe palavra para coisa tão subjetiva, algo como um encontro e uma despedida. Um olhar e carinho para minha própria imagem num espelho interior. Um ‘contentamento descontente...’, algo que brota inesperado e por isso efêmero em sua existência continuamente mutante e flexível, maleável conforme o próprio sentir. Apenas sei dizer que é maravilhoso estar conectada ao Todo de dentro e fora de mim. Uma lente de aumento das coisas e das pessoas. Uma compreensão dilatada e íntima de tudo. Uma percepção tranquila e poderosa. Sem dúvidas, a letra da música que me veio na cabeça encerra um pouco desse sentido. Emprestarei a tradução da música “Return to Innocence”,  da banda inglesa Enigma, para poder chegar a algo próximo de meu amanhecer, do meu (re)nascer, do meu despertar, da minha alegria em Deus (ou outra denominação).

“Amor...
Devoção...
Sentimento...
Emoção...

Não tenha medo por ser fraco.
Não tenha tanto orgulho por ser forte.
Apenas olhe dentro de seu coração, meu amigo,
Esse será o retorno a você mesmo...
O retorno à inocência.

Se você quer, então ria.
Se você tem divida, então chore.
Seja você mesmo...
Não se esconda,
Apenas acredite no destino.

Não se importe com o que os outros dizem
Apenas siga seu próprio caminho.
Não desista!
E use a chance
Para retornar à inocência.

Esse não é o começo do fim
Esse é o retorno a você mesmo...
O retorno à inocência"

[“Return to Innocence” – Enigma]

Katiuscia de Sá
04 de dezembro de 2012
07h32 a.m.

TEXTO Nº10 - Katiuscia


ESCOLA DE TEATRO E DANÇA DA UFPA
GRUPO DE PESQUISA E EXTENSÃO EM EDUCAÇÃO SOMÁTICA NA DANÇA
Coordenação: Profº Mestre Saulo Silveira


No encontro do dia 26/11/2012 lemos e discutimos o artigo “Como Fazer a Dança Própria?”, de autoria de Ana Milena Navarro Busaid. O texto dela baseia-se em conclusões galgadas em cima das pesquisas do dramaturgo e ensaísta André Lepecki sobre sua proposta artístico-experimental catalogada na ontologia dos movimentos da dança e sua hegemonia,  nos processos de subjetivação do sujeito e no fazer artístico, com o objetivo de abrir caminhos para que o bailarino construa sua dança própria, eliminando ideias pré-estabelecidas sobre conceito de dança na modernidade.

Ao ler o texto entramos em contato com o que normalmente está anexado à ideia de dança: sempre agarrada à execução do movimento (‘fluxo e continuidade do movimento’), assim como para André Lepeck, também fica bastante enfatizado para muitos artistas de outras áreas, até mesmo estudantes de dança e público em geral, de que uma composição de dança para ser considerada ‘dança’ está vinculado ao coreografado fixo, este é o pensamento hegemônico na modernidade acerca deste conceito.

E para desprender tal concepção de rigidez do movimento coreografado, André Lepeck busca associações entre Política, Filosofia e Dança para promover esse Apartheid, e vigorar novas compreensões e leituras do movimento não apenas pelo movimento corporal do bailarino, mas também conceituado numa amplitude irmanada a outros campos do conhecimento, abrindo espaço inclusive, para que o próprio bailarino-criador descubra e/ou imprima sua própria leitura sobre seu movimento, algo como agregar valores subjetivos para dar significação e mais vigor à sua apresentação.

No decorrer do artigo Ana Milena Busaid enfatiza a frase de Lepecki: “a dança imbrica-se ontologicamente com o movimento, é isomorfa com respeito ao movimento” (LEPECKI, 2008), isso quer dizer que durante décadas a dança foi sempre associada e estudada apenas em consideração do movimento coreografado. E essa ruptura do conceito ontológico de ‘dança’ surge no cenário artístico mundial através da dança contemporânea que alarga a atuação do bailarino concedendo-o a inserção de diversos tipos de movimentos e expressividades, inclusive, ‘fora’ do que seja ‘usualmente’ dança.

Para se chegar a este estágio criativo, segundo Lepecki,  o bailarino necessita passar por três eixos para zerar seu corpo e permitir-se escutar até que brote de seu amago a ‘dança pessoal’, anexando a concepção de corpo como unidade linguística . São eles: esvaziar o corpo; afastar a ideia do ‘eu’; e criação da dança própria. Desse modo concebe-se ao corpo do bailarino uma escrita própria (impressões subjetivas, memória emotiva, bagagem de movimentos de tipos de danças outras que estão impressas no soma do bailarino, mas que agora não estão coreografados, servindo apenas como conhecimento acumulado), e estes pontos ajudarão o bailarino-criador a ‘escrever’ seu discurso através dos movimentos na sua dança pessoal, tornando-se o individuo uma entidade linguística.

Lembro-me que no Teatro utilizamos o que usualmente chamamos de ‘pagina em branco’, que é zerar nossos trejeitos inerentes (maneira de falar; andar; agir; sorrir; se comportar; etc...) para dar passagem ao discurso da personagem. E igualmente como propõem Lepecki, para que o bailarino-criador chegue nesse ‘zerar’ ele precisa apagar a rigidez coreográfica em seu movimento corporal no momento de criar sua dança própria, dando passagem ao fluxo continuo do movimento sem tensão ou rigidez, através do fluxo respiratório.

Parece meio paradoxal, mas não é. Como a Educação Somática sugere o individuo sendo entidade em transito, ou seja, em transformações constantes conforme novas descobertas de si mesmo, imprimindo novos discursos de si mesmo, o bailarino-criador também deve observar-se, ajuntando adaptar-se ao que deseja expressar.

Também me veio à associação da dança-teatro Butoh (da qual gosto muito e particularmente tenho predileção para meu trabalho de palco), ou melhor dizendo: Ankoku Butoh: ‘dança das trevas’ em tradução para o português. Este ‘estilo’, digamos assim, de se fazer dança-teatro é um conceito contemporâneo da forma, normalmente diz-se que seus criadores foram os japoneses Tatsumi Hijikata e Kazuo Ohno. O Butoh Surgiu após diversas observações e pesquisas de Tatsumi Hijikata de dançarinos de cabarés, teatro tradicional japonês, performers, técnicas tradicionais de danças ocidentais, das vanguardas europeias tais como  cubismo, expressionismo e surrealismo; etc... e principalmente da concepção de ‘dança’ partilhada por ele e Ohno de que o dançarino não dança para si, mas para reviver algo muito maior.

E de acordo com suas pesquisas de movimento corporal do bailarino, Hijikata catalogou movimentos e dispôs em algo único. Nas palavras de Ohno sobre o Butoh, ele diz: “ Butoh é uma das mais arrojadas formas de dança contemporânea única do Japão. Expressa ao mesmo tempo tantas ideias diferentes que é impossível  defini-la. Ela somente choca e surpreende”.

Interessante lembrar também que essa dança-teatro surgiu à margem das tradicionais e clássicas formas de dança no Japão, e por isso mesmo por alguns anos não foi aceita como dança ou expressão artística do gênero, sendo apresentada apenas em lugares não muito considerados... na década de 50 no pós II Guerra, o Butoh tinha um forte discurso político e de contestação social frente aos traumas gerados na recente história do Japão. O Butoh neste contexto servia de discurso corporal e imagético da dor da perda e da humilhação sentida pelos cidadãos japoneses, cuja nudez dos bailarinos e severidade das formas contorcidas em seus corpos estão intrinsecamente ligados a imagens mentais de seus interpretes, gerando por isso uma dança pessoal não coreografada.

Essa aceitabilidade do que seja dança, também é contestada por Lepecki em seu texto-base para o artigo de Ana Milena Navarro Busaid. Como igualmente acontece no Butoh, cuja improvisação torna-se necessária no momento da apresentação, gritando ao mundo a concepção intransferível de dança pessoal de seu interprete, onde cada apresentação do mesmo tema é única; também é compreendido no conceito desprendido da ontologia da dança que discorre sobre a hegemonia do movimento das formas para que apenas algo coreografado seja entendido como dança.

Nesse contexto abrem-se possibilidades ao bailarino-criador para tentativas e experiências do movimento, libertação da técnica, e ruptura das formas rígidas da coreografia desembocando numa criação autentica de dança (dança pessoal), uma dança que não é fixa.

Para fechar meu texto de diário de bordo, anexo a ele dois vídeos para ilustrar esse conceito de dança pessoal sem coreografias rígidas, dança galgada em imagens subjetivas de seus interpretes-criadores e por isso injetando novos discursos linguísticos e corpóreos para quem faz e contempla. O primeiro vídeo – PILOBOLUS – é uma apresentação de dança-teatro contemporânea; o segundo vídeo um exemplo das mais variadas formas expressivas de Butoh.


04 de dezembro de 2012
06h13 p.m.


Grupo PILOBOLUS


  
Performance de Butoh